segunda-feira, 4 de julho de 2011

A ferida continua aberta

O papo-furado mais estranho que já ouvi na vida é aquele que prega que as pessoas superam as dores e as mágoas com o tempo.

Mentira! Isso pode até ser verdade num sentido metafórico / filosófico. Ou, talvez, no sentido de que, com o tempo, vamos criando barreiras e maneiras de fugir de certos sentimentos e de certas lembranças, num esconde-esconde mental interminável. Mas a verdade, sejamos honestos, é que não existe tempo capaz de cicatrizar certas feridas. E não existe esse negócio de superar as situações.

Isso não quer dizer, naturalmente, que eu desacredite da habilidade inata que nós todos temos de renascer das cinzas e de tentar consertar tudo. O que penso, na verdade, é que seguimos aprendendo a (sobre)viver com as feridas e com as avarias psíquicas, num processo diário de recriação que é, ao mesmo tempo, necessário e benéfico. Mas as mágoas não passam nem são, milagrosamente, transformadas em sentimentos bons. Quando muito, deixam de exercer influência constante sobre nós. Porém, também não há garantias de que seja assim em todas as circunstâncias e, portanto, o mais comum é que elas fiquem latentes, ainda que alguns neguem (ou tentem negar).

Esse é um motivo, aliás, que explica nossa instabilidade como sociedade. Vez ou outra alguém saca uma arma no meio do trânsito e mata alguém; frequentemente, agimos de modo inconsequente e ferimos pessoas que amamos; quase sempre, deixamos o animal que mora dentro de nós fazer suas vítimas sem nenhuma razão aparente.

E tudo por quê? Tudo por quê?

Porque ninguém supera as dores e as mágoas com o tempo. Os atos grotescos que cometemos são como válvulas de escape que nos dão uma sobrevida. As feridas, no entanto, são como vulcões. Podem estar sob controle durante anos a fio, embora estejam sempre prontas para fazer nossa mente entrar numa erupção sem precedentes.

(Em tempo: no final da década de 1980, minha professora de educação artística soltou o comentário "Que relaxo!!", ao constatar minha inabilidade para desenho em uma de minhas atividades. A ferida continua aberta...). 

Gustavo Miranda

Um comentário:

  1. Você vai ver o que é inabilidade em, aproximadamente, 20 dias rs e, prometo, não vou deixar virar OUTRA ferida aberta (como as parábolas do segundo colegial =P)

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