domingo, 30 de janeiro de 2011

Asas do Suicídio

E bate um aperto. Quase uma solidão acompanhada. Um nó. Um caos. Medo do futuro? Do passado? Do quê? Não sei! O que sei é que sinto o tempo passando e vejo meus heróis ficando velhos. Sim, heróis. Velhos. Aqueles que me cativaram tanto, que fizeram tantos milagres e me encheram os olhos de tanta emoção. Velhos! Lentos! Doentes! Esquecidos! Daí vem a constatação amarga de que não são eles, heróis, arquétipos universais, que estão envelhecendo. Sou eu! Eu com minha mais profunda insignificância e efemeridade. Eu com meus erros. Com minhas tolices. Minhas desculpas. E meus desesperos. Sei bem que é preciso ter coragem para enfrentar as interrogações do ser. Porque o aperto vem. A solidão não tarda. O nó cada vez mais enforca, sem que tenhamos nossos heróis por perto para nos salvar. Mas a verdade é que é tão difícil, tão difícil, que as asas do suicídio (asas de falsa liberdade) mostram-se sedutoras demais nesses momentos de pura desilusão.

Gustavo Miranda

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Esperar

Esperar é uma tarefa penosa. E sentir o tempo parado amarra-nos a alma. Finca nossos pés ao chão. Lança-nos no mar da ansiedade. Do pânico. Das reservas e da falta de controle sobre as emoções. É verdade que as religiões muito falam da espera. E também desse descontrole emocional, que deve ser evitado a todo custo. Mas é a vida a melhor professora desses temas que afligem o coração humano e que machucam o ego.

E eis a nossa situação:

Vencer o espaço não foi suficiente. Queremos mesmo é vencer o tempo, muito embora tal empreitada não esteja ao alcance das mãos (de nossas mãos, pelo menos). A verdade é que o tempo parece ser um oponente imbatível. Não obedece a regras humanas. Não se curva diante de nossos caprichos. Pior que tudo: parece estar sempre com o velho sorriso maroto a contemplar as contingências que espetam nosso espírito.

Enfim. Nosso único consolo é saber que não existe nada mais poético que a efemeridade que nos acompanha silenciosamente todos os dias. Isso basta para alguns. Mas não deixa de dar raiva, além de corroer as entranhas.

Gustavo Miranda

sábado, 8 de janeiro de 2011

A morte (do)eu

Meus professores do colégio costumavam dizer que a primeira característica a se observar numa boa redação é a eliminação do "eu". Ou seja, proibiam-nos de escrever em primeira pessoa e, principalmente, de usar o tão desgastado "eu acho". A professora explicava: você não tem de achar nada! Procure ser objetivo e imparcial em sua dissertação! Confesso que era difícil. Porque, no fundo, o pedido era semelhante a este: pense, reflita! Mas nunca diga que é "você" que está pensando e refletindo!

Bem, vamos por partes:

Em primeiro lugar, devo dizer que acho isso uma bobagem, pois quem pensa e reflete é sempre o "eu". Portanto, para mim está claro que, de um ponto de vista teórico, não há "outro" no processo de composição.

Claro que é possível e aceitável usar o "nós" em textos mais refinados, por referência aos estímulos que temos a partir do "outro" ou nos casos em que há várias pessoas envolvidas na trama, mas, na maioria dos casos, o autor do texto é o "eu". É ele que sente. É ele que sofre. É ele que ri. Que ama. Que fica triste. Que se emociona. Enfim. Por que lhe negar a palavra? Por que calar ou omitir suas inclinações? O "nós" é singular. Usa-se por humildade. Ou para aparentar humildade. Mas é o "eu" quem dá forma às ideias. Ele é a mente organizadora.

Sei que há controvérsias e alguns devem estar questionando minhas intenções ao tratar de um assunto tão aparentemente sem importância. Contudo, devo confessar que, na verdade, meu objetivo é refletir sobre o que nós, sobretudo os Ocidentais, temos feito nos últimos séculos (e não apenas nas redações escolares). A aniquilação do "eu". A exclusão das subjetividades. A dissimulação em forma de palavras. Até parece que ninguém mais pode sentir, ninguém mais pode chorar, ninguém mais é dotado de si mesmo. Corpos desalmados. Equilibrados. Academicamente corretos. Mas sem emoção. Nenhuma particularidade. Essa tem sido a marca das sociedades nos últimos 200 ou 300 anos.

O que quero dizer é que a morte do eu, nas boas redações ou mesmo nas tendências atuais que buscam manter os sentimentos e as particularidades distantes do mundo do trabalho e das coisas sérias, é uma farsa, assim como - a meu ver - estão equivocadas também as teorias que dão prioridade ao "nós", ao "outro", e se esquecem do "eu" (não quero entrar em terreno filosófico aqui, apesar de me sentir tentado a isso).

Isso não significa individualismo e nem rendição aos fetiches do ego. Ao contrário. Significa dar voz ao "eu" oprimido. Significa recolocar a alma no palco das experiências, com todas as suas inconstâncias, efemeridades, particularidades, acertos e erros. O politicamente correto cansa! E cansam também as covardias e as relações estereotipadas! É preciso resgatar o "eu", sem medos, sem remorsos, sem traumas (ou melhor: com medos, com remorsos e com traumas, tanto faz).

Essa é, para mim, uma necessidade urgente. Não vai mudar os manuais de redação nem as dissertações de vestibular. Mas quem sabe mude o mundo!?

Um abraço,
Gustavo Miranda